Primavera Sound Porto 2023 | Metade “Chove Chuva” – dias 7 e 8 de Junho
Diz-se por aí que início de Junho é sinónimo de abertura oficial da época dos festivais de (quase) verão. O primeiro no calendário é o Primavera Sound Porto, no onírico Parque da Cidade. Este ano, o recinto alargou para receber ainda mais música, e festivaleiros sedentos de a beber. Com um banquete musical de 4 dias, Óscar (a depressão) também fez questão de aparecer, ora não fosse perder os cabeças-de-cartaz dos dois primeiros dias.
Começa assim a metade “chove chuva” do Primavera Sound Porto.
Ainda sem vestígios de possível mau tempo, Alison Goldfrapp foi o primeiro nome que brilhou no palco Porto. Este palco, o principal, mudou do anfiteatro natural (agora, palco vodafone) para este novo lugar, de costas voltadas para o mar. A artista britânica contagiou alegria em forma de música eletrónica pelo recinto que ia ficando cada vez mais recheado de festivaleiros.
Seguiu-se o concerto de Hykeem Jamaal Carter Jr., também conhecido por Baby Keem. O rapper norte-americano foi recebido com o calor português, que o acarinhou do início ao fim, tendo retribuído com a mesma intensidade de energia. Inúmeros presentes musicais do seu álbum mais recente “The Melodic Blue” (2022) gritavam à formação de mosh-pits que aqueceram ainda mais o recinto. Efeito de luzes, fogo e muita ação – o aquecimento estava mais que feito.
De repente, sentiram-se as primeiras gotas que marcaram a entrada “à grande” do convidado com a vista mais privilegiada do festival, a depressão Óscar. Foi na despedida que chegou, e confessamos que o refresco soube muito bem para amenizar os intensos moshes que se viveram. Gradualmente, a sua intensidade foi aumentando, o gesto de agradecimento para o céu depois deste concerto explosivo, foi trocado pela logística de nos protegermos com impermeáveis, parkas, ou que houvesse à mão. Durante mais de 1 hora, sentiu-se a canção de Jorge Ben Jor onde “Chove chuva/ chove sem parar”, ao ponto das mãos ficarem enrugadas de tanta água. Ainda assim, os festivaleiros respiraram coragem porque viria muito em breve, o nome mais esperado da noite.
Às 00h20, pairou uma nuvem de suspense no recinto; 00h23, nervos à flor da pele; 00h25, ouvia-se “KENDRICK! KENDRICK! KENDRICK!”; 00h27, o dilúvio parou, e Kendrick Lamar começou a fazer o que melhor sabe – a contar a lenda viva do hip-hop que é, através de um repertório inigualável. Êxito atrás de êxito, foi um karaoke contínuo por parte do público que vibrava com cada rima de verdade, angústia, de vida. Foi uma verdadeira viagem musical através das canções do seu álbum mais recente “Mr. Morale & The Big Steppers” (2022), “DAMN.” (2017) até “good kid, m.A.A.d city” (2012). Foi curiosa a reação às músicas não-tão-conhecidas: um silêncio atento, como quem escuta o professor-mestre na sua área, que degusta palavras com uma profundidade elástica que chega aos confins das profundezas do ser humano. Um concerto com um fecho épico, que demonstrou não precisar de muitos adereços para expressar o que a alma tem para contar.
O segundo dia começou seco e cheio de indie rock, embora Óscar estivesse em competição constante com o Sol para ver qual seria cabeça de cartaz. Foi nesta indecisão que os Surf Curse abriram o palco Plenitude. Os festivaleiros, ora vestindo os impermeáveis, ora tirando-os para aproveitar os (poucos) raios solarengos, receberam o surf rock da banda americana com toda a energia que lhe é devida. Desde Buds (2015), até Magic Hour (2022), mas passando por toda a discografia, foram várias as canções tocadas durante os quarenta e cinco minutos de concerto. E não foram embora sem tocar os seus maiores êxitos até ao momento, “Freaks” e “Disco”.
No exato momento em Surf Curse terminaram a sua atuação, já The Beths tomavam conta do Palco Super Bock. Vindos diretamente da Nova Zelândia, trouxeram consigo um peixe gigante para lhes fazer companhia em palco. A doce voz de Elizabeth Stokes entoou por um relvado cheio de pessoas, distribuindo sorrisos e temas de “Future Me Hates Me” (2018), “Jump Rope Gazers” (2020) e do mais recente “Expert in a Dying Field” (2022).
Ainda não sentia a chegada de Óscar quando fomos com pé ligeiro até a um dos novos palcos, o Plenitude, vizinho do palco Porto. A banda que se segue, veio diretamente de Dublin para a invicta – The Murder Capital. O quinteto irlandês apresentou variadíssimas canções do seu álbum mais recente “Gigi’s Recovery” (2023), num estilo punk que gritava à formação de variados mosh-pits. Via-se festivaleiros dos 8 aos 80 (literalmente!!) a absorver toda aquela energia contagiante, e quem não os conhecia ficou, certamente, rendido.
Inevitavelmente, com a chegada dos festivais de “verão” vêm as chamadas “piscinas olímpicas entre concertos” – especialmente – quando dois artistas que estão lista são à mesma hora (a dor!). Ao mesmo tempo que Alvvays encantavam no palco mais recôndito do Primavera Sound (o palco Super Bock), Arlo Parks estaria a brilhar pelo palco Porto. A estratégia? 30 min de Avvlays e 30 min de Arlo Parks. Logística tratada, foi hora de rumar ao palco Super Bock para assistir à banda canadiana Alvvays, que encantaram tudo e todos (como sempre!) com uma boa energia indie-pop. Num repertório que contou com canções desde o seu primeiro álbum “Antisocialities” (2017) até ao mais recente “Blue Rave”(2022), os festivaleiros sorriam de “orelha a orelha”, mesmo com a chuva que decidiu aparecer a meio. 30 min se passaram, e entre músicas houve uma corrida para a ponta oposta do recinto para ouvir a segunda parte do concerto de Arlo Parks. A seguir o rasto da doce voz de Arlo, lá se foi para o palco Porto, onde tudo parecia estar certo: porções de céu azul e passos de dança ao som da batida ritmada de um bom groove.
Já depois do sol ter mergulhado no mar, todos os caminhos deram ao palco Super Bock, preparado para receber os Japanese Breakfast. A banda norte-americana de Michelle Zauner trouxe um indie leve ao Primavera Sound. A melodia perfeita da banda teria sido mais-que-perfeita naquele fim de tarde onde o sol sorriu. No entanto, a energia não fervilhou. Apesar do horário desajustado, Japanese Breakfast demonstraram a qualidade musical que lhes é característica e proporcionaram uma bela massagem aos sentidos.
Nada fazia adivinhar a festa que nos aguardava o Paco Vodafone. Apesar de Óscar estar com toda a sua força, não foi suficiente para parar o público, que dançou freneticamente ao som de Fred Again...Começando com “Kyle (I Found You)”, de facto soube a um reencontro. Ou a amor à primeira vista. De qualquer forma, durante aquela hora e quinze minutos, o duo fundiu-se com o público numa sinergia inacreditável.
Foi com relutância que algumas pessoas saíram antes de o concerto acabar, rumo ao palco Porto, de forma a não perderem pitada do próximo belo acontecimento. Esse trazía-nos Rosalía, em toda a sua humilde grandeza e esplendor. E eis que chegou a acarinhada “Motomami”: cantou, dançou, tocou piano, e até disse algumas frases em português, num espetáculo em que é impossível não ficar rendido. Ouvimos canções do álbum mais recente “MOTOMAMI” (2022), mas também de “El Mal Querer”(2018). Até o público teve oportunidade de participar, quando Rosalía partilhou o microfone com os fãs das primeiras filas. E os que não cantaram ao microfone, gritavam as letras e dançavam à chuva.
Foi nesta euforia que terminou o segundo dia do Primavera Sound Porto 2023. Com ele, acabou também a parte chuvosa do mesmo. A alegria e felicidade de quem se encontrou entre tanta música e amor foi capaz de vencer a tempestade. Óscar, derrotado, seguia o seu caminho. Os festivaleiros, iam recarregar energias, pois o festival ia apenas a meio.
Maria Alves da Silva
Mariana Varejão de Magalhães
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