Tomás Wallenstein, um piano e o Passos Manuel
Um homem, um piano e um copo de vinho. Um cenário que provavelmente acontece diariamente um pouco por todo o mundo. Porém, foquemo-nos num contexto específico: o homem era Tomás Wallenstein, vocalista, guitarrista e teclista dos Capitão Fausto; o piano estava colocado na acolhedora sala do Passos Manuel na passada sexta feira, 8 de outubro; e o copo, apenas porque dá jeito para localizar o acontecimento no mapa, diremos que estava meio cheio de vinho do Porto.
Após uma chegada acompanhada de uma grande salva de palmas, sentou-se ao piano. A partir daí, esquecemo-nos de que estávamos sentados na plateia. A sensação era mais a de estarmos apenas na companhia de Tomás, ouvindo-o tocar e falar de música, do presente, do passado e, sobretudo, da vida em geral e de como ela se preenche de amizades, amor, saudade, surpresa.
Nesta agradável ilusão de proximidade e, até, de intimidade – que o Passos Manuel se revelou, mais uma vez, ser mestre em proporcionar – soubemos que esta digressão surgiu da vontade de se enriquecer como intérprete, algo que levaria invariavelmente o artista a evoluir também como compositor. Como compositor, poderemos acompanhar a progressão no próximo álbum de Capitão Fausto que – segundo foi revelado durante o concerto – está a ser preparado. Como intérprete, tivemos sensivelmente uma hora e quinze minutos para constatar que Tomás Wallenstein está na sua melhor forma.
“Num espírito exploratório ou até quase académico, o repertório sugerido é uma compilação de versões de outros autores, compositores ou poetas, que naquele instante se reunirão em cada sala. Ao poder fazer das suas vozes a sua própria, a intenção é aprender com o gesto, mas também insistir na partilha das ideias e das canções, que depois de nascerem de um só criador passam a pertencer a toda a gente.”
Terno, B Fachada, Luís Severo, Zeca Afonso, Doce e Erasmo Carlos são apenas alguns dos nomes cujos temas foram apresentados naquela noite. Poucos se lembrariam de juntar tão distintos nomes numa setlist, juntando-lhe ainda algumas peças de compositores modernos, e fazendo-a resultar tão harmoniosamente. Como foi mencionado pelo artista, “ter um piano em casa durante uma pandemia torna-se um bocado obsessivo” e, para sorte de quem presenciou este concerto, essa obsessão resultou na montagem deste espetáculo que, de tão rico, simples e genuíno, foi direto ao coração de quem o ouviu.
“Tomás Wallenstein ao piano” é o nome da digressão. Pessoalmente, decidi ir porque, além de ser fã e admiradora não só do Tomás, mas também dos Capitão Fausto e do trabalho que a editora Cuca Monga tem desenvolvido até agora, fiquei curiosa. A premissa era boa, e o facto de não ser claro o conteúdo do que iria ser apresentado – ao contrário de uma apresentação de um álbum, por exemplo – era intrigante. Mais uma vez, Cuca Monga não desiludiu. Mais uma vez, surpreendeu pela positiva e deixou o público a querer mais.
Se, como o homem da noite afirmou, visitar o Porto é indispensável para a manutenção da boa saúde mental, estes concertos são centrais para a boa disposição mental e espiritual do público, pelo que estão reunidas as condições para regressos frequentes e mais momentos bonitos como os desta sexta-feira. Na verdade, sempre estiveram, dado o já longo carinho partilhado pelo público e os músicos Cuca Monga. Ainda assim, tal qual numa relação à distância, é necessário ir renovando os votos de tempos a tempo, para que esta simbiose nunca desvaneça.
E tu, caro leitor, se estás a ler isto com pena de não ter comparecido, nada temas, pois ainda podes adquirir entrada para Aveiro. Os bilhetes têm tendência a vender-se rápido, por isso apressa-te!
Mariana Varejão de Magalhães
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